O CARRETEL DE COSTURA
02/10/2011
C-03
Seu carretel de costura
Eu amarrei com ele os meus sonhos
e o joguei ao mar.
As ondas o levaram,
o transportaram,
o movimentaram para todos os lados,
envolvendo-o com areia,
algas,
ovas marinhas...
Nessa atividade toda,
meus olhos se purificaram,
foram burilados, e se tornaram uma pérola,
nas entranhas de uma ostra gulosa.
Essa pérola é a que você usa,
nesse pendente,
sobre o seu coração.
EM BUSCA DA FELICIDADE
03/10/2011
C-05
No alto da montanha,
um anjo lhe mostrava o mundo
com tudo o que ele possui de bom e de mau:
dores e alegrias;
ódios e amores;
pedras e flores;
rosas e espinhos;
florestas e desertos;
lagos e dunas;
rios e montanhas;
risos e tristezas;
saúde e doenças;
Viu pouca sinceridade e muita hipocrisia;
Grandes fortunas e imensas misérias;
amantes do espírito e amantes da matéria.
Só uma coisa em comum:
a busca da felicidade.
Perguntou então ao anjo:
“Nisso tudo, onde está a felicidade?”
Ele pediu-lhe licença,
enfiou a mão por dentro do seu peito
e arrancou o seu coração que pulsava.
Mostrando-o a ele, respondeu-lhe:
“A felicidade está aqui dentro!
Ela não depende de tudo isso que você está vendo,
Mas do MODO como você vê tudo isso!”
Após colocar de volta o seu coração,
vi crianças brincando,
jovens se enturmando,
pessoas jogando,
pessoas tricotando,
pessoas fazendo crochê,
donas de casa cozinhando,
professores ensinando,
presos trabalhando,
e uma paz o invadiu.
“Você está sentindo essa paz?”
o anjo lhe perguntou.
Ele acenou afirmativamente.
A suavidade da noite e a brisa do amor
se impregnaram nele.
“O paraíso pode ser aqui!”,
-disse-lhe o anjo.
“O amor pleno e a paz
são os combustíveis da felicidade!”
Nisso ele acordou.
Estava preso a um leito de hospital.
Já era de manhã.
O sol começava a entrar no quarto.
Uma enfermeira entrou,
buquê de flores nas mãos,
um cartão,
e lhe disse:
“É um presente de uma amiga sua”.
Leu o cartão e sorriu.
Percebeu que, mesmo num leito de hospital,
quando damos e recebemos amor,
quando nos deixamos amar,
A felicidade pode nos sorrir.
NO SILÊNCIO DA PRAÇA
04/12/2011
C-13
O silêncio começou
Naquela praça do interior
Em que até então
A balbúrdia reinara.
Papeis diversos voavam,
Embalados pelo vento.
Embalagens variadas
Sobravam no relento.
Um gari, solitário,
Cigarro no canto da boca,
Soltou uma baforada,
A fumaça se espalhou.
Levantou-se, vassoura em punho,
Deu uma olhada amarela,
Desanimado e sem gosto,
Seu trabalho enfrentou.
Aos poucos, tudo limpo,
Em cara nova se tornou.
Uma praça, agora limpinha,
Não trazia mais as lembranças
Das alegrias,
Das tristezas,
Das brigas,
Dos beijos e abraços.
Da criançada brincando.
Final de domingo.
Tudo terminou.
DESENCANTO
(13/08/2012)
C-388
Frágeis colunas sustentam a sanidade...
Parcos lampejos de uma opaca luz
nos mostram o caminho.
Tateando no negror de uma noite sem fim,
a angústia nos tolhe um grito abortado...
Tropeços e avanços,
estagnação e retrocessos,
Coleção de quedas e soerguimentos,
e de vozes diversas em conteúdos e intenções...
Quando o cristão pensa nisso,
o suor se aflora em sua testa,
As pernas tremem, os lábios se contraem,
vultos monstruosos invadem seu universo.
Suaves murmúrios brotam das santas letras,
embaralhados,
misturados com os ruídos do mundo,
que os abafam,
que os cobrem,
que os retalham,
e se apresentam difíceis,
inalcançáveis,
indesejáveis,
insuficientes para a felicidade.
O relógio carrilhão o acorda do torpor,
com sinos que tocam o “Louvando a Maria”,
que faz acender-lhe as luzes,
que mostram as cruzes,
esparsas no caminho que ainda ele tem que percorrer.
O CAMINHO DO PEREGRINO
(02/09/2012)
C-392
O caminho é longo,
mas o peregrino só vê onde está.
Não há o que já percorreu,
não há o que ainda tem de percorrer...
Só vê o presente,
só vê o agora,
o hoje,
o momento presente.
Algumas trilhas aparecem
á esquerda, à direita.
Tem o desejo de segui-las,
mas receia magoar-se,
receia não poder mais voltar
ao caminho a ele destinado.
Há pessoas que voam,
há pessoas que se arrastam,
outras que caminham,
outras que choram,
há pessoas que esbravejam contra ele,
outras que o escarnecem,
há pessoas que o odeiam,
mas também há muitas que o amam.
Afirma melhor a vista e vê,
à sua frente,
o único objetivo de sua vida:
viver o dia de hoje,
viver sob a luz divina.
Enxuga as lágrimas,
afirma o passo,
e prossegue o seu caminho.
O peregrino não se importa
ao ver a seu lado,
os cães que latem
querendo mordê-lo.
AS ASAS DO MUNDO
18/12/2012
C-21
As asas do mundo me pegaram
e a bem longe me conduziram,
a lugar algum,
a lugar nenhum,
e de lá pude ver as tragédias do mundo.
Vi as misérias do ser humano,
as hipocrisias da vida social,
as falsas necessidades da sociedade de consumo,
as exigências da convivência forçada,
esmagada pelo egoísmo,
pelo hedonismo,
pelo preconceito e aversões.
Vi um lugar imenso,
sujo,
estercado pelos dejetos dos ricos
e pelo desleixo dos pobres.
Aqui e ali nasciam flores belas,
perfumosas,
contrastando com o demais cenário.
Flores que persistiam em embelezar,
apesar da violência,
da ganância,
do orgulho,
da imprudência,
da impiedade.
Que orgulho pode haver num monte de esterco?
Que perfume persistir num odor fétido?
Assim é o mundo,
Assim é a sociedade,
bondade e maldade,
suavidade e dureza,
feiura e beleza,
alegria e tristeza,
encontro e saudade,
pobreza e riqueza,
orgulho e vaidade,
moderação e insaciedade,
uma verdadeira cloaca é esta humanidade.
As asas do mundo de volta me trouxeram,
em mim mesmo me puseram,
e voltei ao mesmismo,
grudei na face meu sorriso,
perfumei meu corpo,
tirei as rugas de meu rosto,
pintei meu cabelo,
troquei minha dentadura,
firmei minha postura,
e voltei à humanidade.
Voltei à cloaca.
Voltei à borrasca
de um violento tufão,
o tufão de nossas vaidades,
o vendaval de nossas ilusões,
o terremoto de nossas más ideias.
As asas do mundo me ensinaram
que há um só modo de viver:
que nada me perturbe,
que nada me espante,
porque tudo passa!
A paciência tudo alcança!
Deus nunca muda!
A quem a Deus tem, nada lhe falta
SÓ DEUS BASTA! (Sta. Teresa d'Ávila)
O SORRISO
DEZEMBRO DE 2012
C-398
Pediram ao poeta alegria,
que a natureza sorrisse para ele,
que voltassem as cores
as flores
o cantar dos pássaros
a harmonia do universo
que ele cantasse a beleza,
que o sorriso se estampasse em seus lábios,
que passasse a tristeza.
Rabiscou alguns versos
que ficaram dispersos,
nada que os unisse!
Juntou as palavras,
colou-as com esparadrapo,
fingiu um sorriso,
e surgiram estas linhas.
"Amigos!" - disse o poeta,
"eu quero muito sorrir!
E meu coração isso até me implora!
Mas enquanto o meu semblante sorri,
o “danadinho” se entristece e chora!"